A JUVENTUDE COMO FORÇA DE RUPTURA
Geração Z, Parlamento e Discord. O que podemos aprender com os fatos recentes no Nepal.
Essa é a newsletter mensal aberta para todos os assinantes da Comunidade Moovers. Escrita pela futurista e Diretora Executiva da Moovers Monica Magalhaes, que compartilha insigths, reflexões e análise de tendências em tecnologias emergentes.
Hello moovers! Monica Magalhaes por aqui 👋🏼
Vejo a política como um espaço onde se decide o futuro coletivo e, pra mim esse é um dos melhores lugares para aplicarmos a tecnologia, que hoje é o maior vetor de transformação social.
O fato ocorrido no Nepal essa semana, deixou claro que as redes sociais, neste caso o Discord, não são só ferramentas de comunicação, mas infraestruturas para organizar, deliberar e criar novas formas de democracia. É um exemplo vivo do que o futurista Robert Jungk chamava de “oficinas de futuro” e do que Arthur Waskow via como o ativismo jovem desenhando alternativas ao presente.
Nosso grande desafio é tornar a tecnologia neutra. Ela redistribui poder, muda quem pode falar, quem pode decidir e até quem pode ser ouvido no espaço público. A maioria das pessoas ainda enxerga a IA ou as plataformas digitais como “ferramentas de produtividade” ou “entretenimento”, sem perceber que, no fundo, elas também podem ser arenas de governança.
A JUVENTUDE COMO FORÇA DE RUPTURA
Em setembro de 2025, o Nepal tornou-se palco de uma crise política extrema.
Jovens, indignados com a corrupção, o nepotismo e os abusos de poder do governo, iniciaram uma onda de protestos massivos, organizados principalmente nas redes sociais.
O governo, então, respondeu com uma medida drástica: o bloqueio de 26 plataformas digitais. Não foi apenas uma decisão técnica para controlar “fake news”, mas um ato político com três objetivos centrais: controlar a informação, tentar frear a escalada da violência, impedindo que os jovens se organizassem em poucas horas para levar milhares às ruas, e, por fim, proteger a autoridade governamental, diante do desgaste crescente provocado pelas denúncias de corrupção e nepotismo que corroíam sua legitimidade.
O efeito, no entanto, foi o oposto. A juventude não apenas resistiu, mas transformou o bloqueio em símbolo de um futuro que já não pode ser contido pelas velhas estruturas. Ao tentar silenciar os jovens, o governo acabou produzindo ainda mais insatisfação, convertendo as redes bloqueadas em emblemas da censura e acelerando a crise de legitimidade.
Diante da restrição, dezenas de milhares de jovens migraram para a plataforma Discord e ali construíram um verdadeiro parlamento digital. Em salas de voz, texto e vídeo, organizaram assembleias virtuais, debateram os rumos do país e realizaram votações informais que chegaram a mobilizar mais de 100 mil participantes simultaneamente. Foi nesse espaço que o nome de Sushila Karki, ex-chefe da Suprema Corte, emergiu como candidata de consenso para assumir o cargo de primeira-ministra interina — antes mesmo do anúncio oficial.
O uso do Discord como canal de participação democrática e escolha de lideranças é inédito e marca uma mudança profunda em como o debate político e a organização social estão acontecendo neste período de crise.
Ativismo como laboratório de futuros
Historicamente, a juventude ocupa um lugar privilegiado na construção do futuro. Foi assim na Primavera Árabe de 2011, quando jovens hiperconectados ocuparam as ruas para denunciar regimes autoritários em diversos países do Oriente Médio. Foi assim também em Tiananmen, na China, em 1989, quando estudantes universitários lideraram protestos por reformas políticas e maior abertura democrática.
Na maioria das vezes, esses movimentos foram brutalmente reprimidos. No passado, os jovens se levantaram contra a fome e a miséria. hoje, enfrentam injustiças sociais e os impactos da crise ambiental. E as redes sociais lhes concederam, pela primeira vez, o título de cidadãos globais, capazes de projetar sua voz para além das fronteiras nacionais.
A juventude não está aprisionada pelas amarras do presente. Não carrega o peso das carreiras consolidadas, dos compromissos institucionais ou das alianças de poder que limitam a ação das gerações anteriores. Essa relativa liberdade lhes dá a capacidade de experimentar e questionar convenções que pareciam inquebráveis para os mais velhos.
Assim, os jovens não atuam apenas como massa de protesto, mas como laboratório vivo de futuros democráticos, questionando não só os líderes de hoje, mas também a lógica de poder que tenta definir o amanhã de forma unilateral. O ativismo juvenil não deve ser visto apenas como reação, mas como ensaio do amanhã. Cada protesto, cada movimento social, cada ocupação é um experimento de como o poder pode ser redistribuído, de como decisões podem ser tomadas coletivamente e de como novos valores podem se tornar práticas concretas.
Se as gerações mais velhas tendem a proteger o status quo por estarem ligadas a estruturas já consolidadas, os jovens estão, de forma literal, mais próximos do futuro. São eles que viverão as consequências das decisões políticas, econômicas e ambientais tomadas hoje. Isso lhes confere não apenas um direito, mas também uma obrigação moral de intervir na construção do amanhã.
Diferentemente das gerações anteriores, esses jovens têm uma relação mais íntima com o futuro. A Geração Z no Nepal é formada majoritariamente por pacifistas sem histórico de violência, mas que neste momento se levantam porque acreditam em uma sociedade mais justa para as próximas décadas.
Habilidosos no uso dos meios digitais, de que outra forma poderiam ser ouvidos?
Agora a pergunta fica para você: como enxergamos esse papel da juventude como catalisadora de futuros em ruptura?
let’s keep mooving,
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