Limites históricos para debates éticos
Você daria carta branca para seus filhos utilizarem sua imagem com movimentos e falas para a eternidade?
CHECK-IN
✓ A polêmica: precisamos reconhecer, ALMAPBBDO arrasou na campanha da Volkswagen
✓ Crer pra ver: Com Bruce Willis foi pior, os Russos nem pediram por favor e nem pagaram cachê
✓ A problematização: Não é de hoje que a gente problematiza tudo
✓ A história: Qual o limite de tempo que devemos considerar em debates éticos?
✓ A resposta: Não dá para resumir o veredito em certo ou errado
A POLÊMICA
Antes de falarmos da polêmica da semana, precisamos reconhecer que a ALMAPBBDO arrasou na campanha da Volkswagen de lançamento da nova Kombi Elétrica ID-Buzz. A ideia foi genial e como eu gostaria de ter participado de um projeto desses! Mas são várias camadas, vamos tentar desenrolar algumas delas.
Mesmo que você já tenha uma opinião formada, vale vir aqui e refletir um pouco comigo ;)
Primeiro, vale lembrar que aqui não tem ponto sem nó, lá dentro ninguém foi pego de surpresa. Publicitário sabe que em primeiro lugar vem a emoção e só depois a razão. Nesse contexto, a maioria se entregou ao lado romântico de ver Maria Rita e Elis cantando juntas, muitos sem conseguir diferenciar o que é AI e o que é um dublê. Mas, na sequência, houve uma enxurrada de posts sobre a ética envolvida no direito de uso da imagem de Elis.
O questionamento é válido. Quem nasce em um país democrático aprende desde cedo que tem liberdade de expressão e responde por seus próprios atos. Claro que a filha autorizou o uso da imagem da mãe, até porque o legado do artista é de propriedade da família.
Mas pense comigo, você daria carta branca para seus filhos utilizarem sua imagem com cenas e falas para a eternidade? Sabendo que comportamentos mudam com o passar do tempo e as novas gerações trazem hábitos desconhecidos? Complexo.
CRER PRA VER
Em setembro de 2022, Bruce Willis apareceu em um comercial de TV na Rússia. Logo, o vídeo viralizou e Bruce declarou que não havia participado de nenhuma gravação. A campanha foi feita pela empresa DeepCake, que não pediu autorização para utilizar inteligência artificial generativa e reproduzir o rosto de Bruce Willis.
Nesse momento, começa o debate. O ator, infelizmente está fora das telas. Aposentado por motivos de saúde, deixa seu legado de filmes de ação para a eternidade. Ops! Mas não. Agora é possível continuarmos criando novos roteiros sem a presença física, com a participação em forma digital. Enquanto Bruce está vivo e respondendo por seus atos, ele pode decidir se deseja ou não participar de tais projetos tecnológicos. Mas a questão é: conhecendo o mundo hoje, o que fazer com os direitos autorais de quem não está mais vivo?
A PROBLEMATIZAÇÃO
Não é de hoje que a humanidade problematiza tudo. Em 1826, começa a história da fotografia. Até então, as pessoas só podiam ser registradas pelos artistas em desenhos, esculturas, pinturas. De repente, aparece uma máquina e ela usa produtos químicos.
Da mesma forma que ouvimos hoje sobre a IA generativa, na época muitos reclamaram que a fotografia mataria o trabalho artístico. Até que, em 1884, uma lei regulamenta o uso da fotografia para aquele que a cria. O mundo está cheio de fotos de pessoas que já morreram, e elas circulam há tempos em campanhas, filmes e são citadas em músicas. A diferença agora é que também tem som e movimento. Ou seja, sempre vai existir a problematização por parte daqueles que não curtem e não concordam, e tudo bem, não precisamos nos alinhar com tudo.
A HISTÓRIA
Mas qual o limite ou período histórico que devemos considerar em debates éticos? Pense comigo.
Os livros de Monteiro Lobato hoje seriam considerados racistas. Devemos apagar essa literatura da nossa história?
Diversas empresas brasileiras ainda em operação financiaram a ditadura. Elas deveriam ser condenadas e deixar de existir?
As pessoas e empresas dessa época já não existem mais. Viveram e tomaram decisões com aquilo que lhes foi dado e ensinado no tempo em que viveram. Se vamos falar de ética, precisamos considerar o espírito do tempo em que vivemos, os valores, a cultura e o comportamento. Que sentido faz aplicar a régua de julgamento de hoje em personagens e histórias do passado?
O TREND
O Business é conhecido como #DeathTech, diversas soluções estão surgindo conectando tecnologia e o pós-morte ou luto.
Na China, histórias de Griefbots, ou bots para o luto, estão surgindo à medida que o mundo se fixa em IA generativa como o ChatGPT.
A ascensão da AI na China criou um business onde funerárias ampliaram seu portfólio de serviços recriando entes queridos com a tecnologia.
Usando fotos, gravações e mensagens antigas, eles treinam programas de bate-papo para imitar os mortos.
A tecnologia pode levar a cenários com sérios problemas éticos além de causar danos emocionais.
A RESPOSTA
Essa não é uma resposta simples, não dá para resumir o veredito em certo ou errado. No mínimo, cinco contextos precisam ser considerados: o consentimento, seja da própria pessoa ou da família; o conteúdo de respeito; as reais motivações por trás do objetivo de criar tal conteúdo; e, principalmente, o impacto emocional em familiares e amigos.
Agora, é certo que, seja qual for a forma que a regulação vier, ela terá consequências reais para o futuro da expressão criativa.
Boa semana, be fearless!!!
FILME: ARNOLD
Sinopse: Arnold Schwarzenegger transitou por diferentes cenários ao longo de sua vida, em cada fase ou ciclo atuou de forma completamente nova. O documentário inspira ao contar sua história de perseverança e resiliência e ao mesmo tempo as derrotas da sua vida pessoal, que nos leva a refletir sobre ganhos e perdas e o que realmente importa quando a gente se aproxima do final da nossa história.
Sobre a autora desta newsletter
Monica Magalhaes é especialista em inovação disruptiva, é palestrante e educadora de inovação para times e empresas. Também é fundadora da Agência Disrupta de Exploração de Futuro e construção de experiências de inovação.